06/10/2013 12:13

books.google.com/books?id=uKUkCKTgPskC&printsec=frontcover&dq=inauthor:%22TECA+ALENCAR+DE+BRITO%22&hl=pt-BR&ei=-VdKToiRGci70AGK2uXrBw&sa=X&oi=book_result&ct=result&resnum=2&ved=0CDgQ6AEwAQ#v=onepage&q&f=false
Lições de vanguarda
CARLOS ADRIANO
BERNARDO VOROBOW
A música brasileira tem um sinônimo em alemão: Hans-Joachim Koellreutter. Compositor, maestro, educador e esteta, ele nasceu em 2 de setembro de 1915, em Freiburg (Alemanha), e desembarcou no Rio de Janeiro em 16 de novembro de 1937. Instaurador de um trabalho fundamental de criação
e formação, sua trajetória e experiência cravam-lhe o nome como marco zero do novo na cultura musical do Brasil.
A revolução de Koellreutter compreende um projeto artístico e humanístico de amplas dimensões. O debate e a difusão de idéias circulam por ensino, publicações, regência de concertos, gestão de instituições, animação cultural e a própria obra musical.
Sua pedagogia sacudiu normas caducas de conservatório e fez (literalmente) escolas Brasil afora, laboratórios de disciplina e inquietação. Tocou e lecionou na Europa, Ásia e EUA. Formou maestros como Rogério Duprat, Julio Medaglia, Diogo Pacheco, Isaac Karabitchevisky, Olivier Toni, Benito Juarez; compositores como Cláudio Santoro, Edino Krieger, Guerra Peixe, Eunice Katunda, Marlos Nobre, Damiano Cozzella; pianistas como Geni Marcondes, Gilberto Tinetti, Clara Sverner; músicos como Tom Jobim, Severino Araújo, K-Chimbinho, Tim Rescala, Tom Zé. Caetano Veloso não foi seu aluno, mas é tomado por "excitação feliz e gratidão" ao ouvir o nome do professor, crucial em sua formação (leia as entrevistas com Tom Zé e Caetano).
Ensinou composição no Centro Internazionale di Musica Contemporânea de Milão (Luigi Nono foi seu aluno) e no Instituto Internacional de Música de Darmstadt (célebre celeiro da vanguarda: Stockhausen, Pousseur, Berio, Boulez), em 48. Em 49, participou dos Congressos Internacionais de
Compositores Progressistas, em Praga, e de Compositores Dodecafônicos, na Suíça (com John Cage). Presidiu o Congresso Internacional de Composição Dodecafônica e a Sociedade Internacional de Música.
A primeira vez que o Brasil ouviu as notas dissonantes de Webern e Cage (entre outros) e música medieval e barroca em instrumentos originais foi pelas mãos do maestro. Ele chegou a dar aulas de música de vanguarda durante o dia e à noite tocar (em sax e flauta) sambas, valsas e chorinhos no
Danúbio Azul, bar da Lapa (Rio, 38).
Com bolsa da Fundação Ford, "por 25 anos de serviços prestados ao Brasil", foi artista residente em Berlim (62). Atuou como diretor do Instituto Goethe em Munique (63-64), Nova Delhi (65-69), Tóquio (69-75) e Rio (75-80).
Preocupado com a sociedade de massa (tecnológica e industrial), vê na arte meio de liberdade, comunicação, educação. Fez crítica musical em jornal e elaborou reflexões de rigor conceitual (artigos, aulas, livros). As dez línguas que fala, ele as aprendeu "para conhecer o outro". Naturalizou-se brasileiro em 1948.
"Tudo o que choca, conscientiza", declarou. Sua personalidade imantou polêmicas e controvérsias, que se propagaram por imprensa e profissionais. Foi assim na querela nacionalismo x dodecafonismo (50) e na palestra "Função e Valor da Música na Sociedade de Amanhã" (77).
Enfrentou detratores e o abandono de ex-discípulos. Realizou rara síntese entre cultura oriental e física moderna, espiritualidade milenar e teoria quântica (do zen à incerteza): a "estética relativista do impreciso e do paradoxal", amálgama da alma dos contrários complementares e da invenção permanente.
Suas composições (ele prefere chamar de "ensaios") modelam a música como experiência de conhecimento e percepção. Arranjos juntam oboé e agogô, flauta e marimba, fagote e bandolim, piano e tam-tam, tramando estruturas atonais, seriais e aleatórias, rompendo regras convencionais.
Das quase 80 obras destacam-se: "Música", "Mutações", "Cantos de Kulka", "Advaita", "Yûgen", "Tanka", "Mu Dai", "Issei", "Ácronon", "Constelações", "Retrato da Cidade", "Dharma", "Wu-Li", "Áudio-Game", "Panta Rhei", "Café".
Aos 84 anos, dá aulas e palestras, trabalha em antigos e novos projetos, pensa e inventa.
Nas aulas de dança e movimento da Prof Melina estamos lendo um texto que nos mostra um pouco mais de Koellreutter:
O movimento que recria o mundo: um colóquio pedagógico-musical entre Laban e Koellreutter
A vida é movimento, tal qual a conhecemos.
A natureza do sistema do movimento criado por Laban tem dupla função: libertadora e reintegradora. Ao isolar o gesto e codificá-lo, ele resgata o indivíduo dos automatismos e da massificação. Lança-o na consciência de si mesmo, mediante o movimento.
Koellreutter: visão em espiral simultaneísta. A revisão da historicidade, à luz da percepção humana que ele preconiza, também visa libertar - o sujeito, a história da música - do isolamento que a tirania do linear sucessivo impõe à ordem das coisas.
Segundo Koellreutter, durante a história, o homem passou por quatro níveis de conscientização em relação às as artes:
1º) Mágico: não há conciência de tempo e espaço / ritmo isométrico / uma só intensidade / música polidirecional e monodimensional. Ex: música dos pigmeus.
2º) Pré-racionalista: noção de tempo e espaço / música tem função de comunicar com Deus / música polidirecional e monodimensional. Ex: canto gregoriano.
3º) Racionalista: homem descobre a perspectiva / melodia é elemento musical / harmonia: tridimensionalidade / consonância e dissonância. Ex: Bach e Beethoven.
4º) Integrador: pós fisica quântica / transformação da noção de tempo e espaço / transcende o conceito de tempo / polirritmia (Stravinsky), dodecafonismo (Schonberg), planimetria (Ligetti) e minimalismo (Steve Reich).
Hans-Joachim Koellreutter enfatizava a simultâneidade e a historicidade da percepção humanana.

www.youtube.com/watch?v=UsTmp_1hO0o
www.youtube.com/watch?v=48i928XwoIs
www.youtube.com/watch?v=O4clBOP_-7M
www.youtube.com/watch?v=5szDPQ-hiZk